É Domingo de Páscoa e eu não estou onde devia estar.
Hoje deveria ter acordado cedo e ir para a cozinha ajudar as minhas Marias a preparar o almoço, enquanto arrelio a minha mãe com os meus mil palpites. Devia ter perdido uma hora na garrafeira, a namorar os vinhos antigos comprados pelo meu pai – conseguia sempre descobrir um novo, de cada vez que lá ia. Como o almoço era borrego, lá levaria um bom tinto Alentejano. Devia ter posto a mesa na sala de jantar, decorá-la com flores apanhadas no jardim e fazer os meus guardanapos em forma de orelhas de coelho. Teria feito vários, pedia palpites, desfazia-os e voltava a fazer, tendo perdido nisso uma hora. A minha mãe, arreliadíssima com o facto de eu possivelmente ainda estar de pijama, começaria com aquele tom de voz, e já me trata por Ana Margarida. Lá iria eu, começar a despachar-me e acordar o marido que, obviamente ainda deveria estar a dormir. Devia ter decantado o vinho como tanto gosto, numa cozinha já “cheia” de familia e aromas. Nunca fomos muitos mas isso de nada importa.
Deveria ter comido um borrego ou cabrito no forno (agora que parte da familia é do Norte já há essa opção), o arroz doce da minha mãe e o pão de ló do meu sogro. Devia encher a barriga das amêndoas torradas caseiras. Devíamos ficar na mesa até às tantas da tarde, entre conversas e degustações de vinhos e digestivos. Devíamos acabar a tarde no sofá a ver um filme, sem qualquer tipo de distância de segurança. Porque cabemos sempre todos.
Hoje, além de ser Páscoa, é também o Aniversário do meu Pai. É algo que me faz ainda confusão, os dias de aniversário de quem já não está cá. Sei que, por momentos, iria imaginar como seria ele com 65 anos, sentado connosco, nesta mesa da Páscoa, potencialmente a beber whisky com o meu marido, (como eu gostava que ele o tivesse conhecido), e a elogiar os cozinhados da minha mãe. Mas hoje não irei conseguir isso sequer.
Hoje, estamos todos reunidos à mesa, juntos através de uma tela de ecrã.
Deste lado, o folar foi feito por mim, para tentar que haja um pouco da Páscoa por estes lados. Não partilhamos a mesma comida, os brindes são virtuais e não há abraços daqueles bons, que querem dizer mais do que palavras. Inglaterra, Polónia, Barreiro, Lisboa e Porto, todos assim, juntos numa tela.
E assim se vai passar a Páscoa, em Família como deve ser, mas com uma sensação de vazio tão, mas tão grande.
Hoje, percebemos todos, que as maiores banalidades são as que mais contam, e as que mais sentimos falta.
Hoje, damos ainda mais valor ao facto de podermos estar juntos, como se nada fosse.
Uma Boa Páscoa, apesar de tudo.
3 Responses
Páscoa diferente, mas tão viva e vivida, pois o amor que vos une é agora, “se possível” ainda mais forte. Beijinhos tudo de bom
Um grande Beijinho